Eu tenho saudades de fazer coisas que fiz, mas também tenho das que não fiz. A impressão que tenho é a de que as coisas que eu não fiz parecem ser mais evidentes na minha memória. Eu lembro dos meus sentimentos, do quão exaltada eu ficava diante de festas e encontros que nunca vivi. Eu lembro dos meus amigos conversando poesias, música, e sinceridade. Eu estava bonita, com os olhos cheios de esperança e dançava feito Salomé no encontro com a pomba gira. São lembranças tão fiéis. Sinto os cheiros do tambores, das flores, dos cabelos lavados no rio, da minha horta, onde eu plantava brotos e onde eu também cozinhava para meus amigos, assim, no meio do mato mesmo. Eu estava tão solta, tão lindamente livre, e isso fazia os vampiros que até hoje me perseguem dançarem comigo. Hoje eu tenho certeza que não quero dançar com todos os vampiros. As vezes fico impressionada com o tanto de coisas não vividas. Estou cansada, esperando que alguém me resgate, ou que venha alguma experiência platô, algo que me caiba a sorte de ser feliz. Estou esperando o dia de tirar todas as roupas velhas. O meu corpo adoece junto com minha alma, ele está cheio de sentimentos usurpadores. O mais estranho disso tudo é que na semana passada eu me olhei no espelho e me vi especialmente bonita. Vi coragem, vi força, vi sensibilidade, vi tantas coisas, tantas, e elas sempre desaparecem quando eu volto à minha casa.